segunda-feira, abril 20, 2015

A minha liberdade



Em Abril me fiz gente. Saí, a custo, do ventre de minha mãe, virada "do avesso". Mau sinal, dizem, pois que quem assim nasce está predestinado a ter mau feitio. Não era para ser mulher. Meu pai me queria homem e não foi com um sorriso na cara que me viu pela primeira vez. Cresci Maria mas brinquei muito à Manel. Trepei às árvores, rodei arcos, nadei no rio com câmaras de ar de pneus a fazer de bóias, arranquei grilos das suas tocas a fazer xixi lá para dentro, esfolei os joelhos em calções curtos. Cresci mulher quando os homens eram mais livres. Foi nos livros que descobri a liberdade, primeiro, foi em Abril que a liberdade passou por mim, depois. Visto a liberdade de vermelho, cor de sangue, cor de cravo.


26 comentários:

  1. Da Tua Vida

    Da tua vida o que não podem entender
    Nem oiro nem poder nem segurança
    Mas a paixão do Tempo e de seus riscos
    Tu buscaste o instante e a intensidade
    E foste do combate e da mudança
    Por isso um rastro de ruptura e de viagem
    Ou talvez este fogo inconquistado
    Como breve eternidade
    De passagem

    Manuel Alegre, in "Chegar Aqui"

    Boa semana, Maria Abril Liberdade! :))

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    1. Sempre gostei muito da poesia do Manuel Alegre. Obrigada!

      Beijos, Legionário, vermelhos. :)

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  2. Olá, Maria.
    Isto é que é "viver e aprender", como diria a minha avó, porque eu, que também nasci a custo, pois que nem saí: tiraram-me! - não sabia que esse era sinal de mau feitio! tanta coisa, finalmente, vê-se explicada.
    Brincou até não mais poder, que é como deve ser, independente de ser-se Maria ou Manel, que isso é que é justo, ainda mais para quem nasce no mês que se diz da liberdade ;)
    Belo texto. Gostei.
    bjn amg

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    1. Retrato de uma mulher que, qaundo menina, não cabia dentro de saias ou de sapatinhos de verniz.

      Beijos, Carmem, e muito obrigada. :)

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  3. Fantástico este post!
    Parabéns, Maria, escreves bem pra caramba!
    Beijinho

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    1. Muito obrigada, Ricardo, apesar do exagero. :)

      Beijos. :)

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  4. Nasci em 1976. Fiz-me gente quando percebi Abril.
    Grande recordação me trouxeste, Maria. Também eu nadava com as câmaras de ar.
    E que grandes eram. Davam quase para 10!!!

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    1. Abril trouxe a muitos novos olhares.
      Vamos dar um mergulho? ;)

      Beijos, Uvinha. :)

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  5. Também encontro a minha liberdade nos livros*

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  6. Eu gosto de pessoas assim, viradas do avesso e com um coração grande :)
    Belo texto Maria :)
    Beijos

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    1. Olha que o avesso pode ser perturbador. :)

      Beijos, I. :)

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  7. Nunca somos totalmente livres. Fazemos apenas o melhor que podemos para isso, quando nos deixam e onde nos deixam.

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    1. É uma questão de definir liberdade.

      Beijos, Luísa. :)

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  8. Abril também passou por mim, era eu já gente à espera de liberdade :)
    Bonito Maria ;)

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    1. Eu também era gente, GM. Gente disposta a aprender a viver.
      Obrigada.

      Beijos, GM. :)

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  9. Que belo auto-retrato
    (o poema de Natália Correia é um adequado enquadramento... )

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    1. Muito obrigada, Rogério.
      (Natália é sempre adequada)

      Beijos. :)

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  10. A liberadade é o maior acto de responsabilidade que conheço. Há pessoas que sabem ser livres e que sabem conceder liberdade. Não conheço muitas pessoas assim, mas tenho para mim que tu, Maria és um bom exemplo a dar :)
    Deixo um beijo com muita estima.

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    1. Gostaria muito de ser como os teus "olhos" me vêem.
      Muito obrigada.

      Beijos, Sandra. :)

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  11. Excelente texto! Mas só há liberdade a sério...

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    1. ...quando houver, a Paz, o Pão, a Habitação, Saúde, Educação...
      (obrigada)

      Beijos, Carlos. :)

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  12. É melhor ter mau feitio do que feitio nenhum.
    Fiquei encantado com a personagem descrita, pois entendo, mulher plena é a "mulher d'armas", tem de saber assobiar, trepar e "fazer trinta por uma linha". Só essa estirpe alcança a plenitude da liberdade.
    "A Liberdade está a passar por aqui", Maria.

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    1. Temos que dar uma mão a essa Liberdade, enquanto a podemos agarrar!
      (obrigada)

      Beijos, Agostinho. :)

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