sábado, junho 30, 2018

Infância

(Andrea Constantini)

Joana tinha sido despertada do torpor que a assaltara depois do almoço pela voz chilreante do menino que brincava sozinho no jardim. Sentara-se num banco confortavelmente refrescado por um rododendro de flores rubras e vivas, que deixavam cair uma pétala de quando em vez ao beijo suave do vento.
Devia ter uns cinco anos, o menino do carrinho amarelo. Chegavam-lhe algumas frases soltas: Vai! Voa! Olha o passarinho ali! Logo, vamos dormir com o ursinho, sim? Vruuuuuum! Vruuuuum!
Sorriu e recordou as brincadeiras no jardim da casa grande: pés descalços, cabelos em desalinho, em perseguição de um pardalito mais jovem; joelhos na terra, olhos brilhantes à espreita de um grilo cantor que se escondia no fundo do pequeno buraco; gargalhadas sonoras em reboladelas com o Juno, cão rafeiro e atrevido, a fazer-lhe cócegas nas pernas com a cauda irrequieta...
Levantou-se, aproximou-se do pequeno automobilista improvisado, sentou-se no chão, e disse-lhe: Queres fazer uma pista de terra para o teu carrinho?


terça-feira, junho 12, 2018

Torradas com chá de rooibos


(Jean Metzinger )

Sabia que o frio entrava sempre que a porta verde se abria, a cada cliente que entrava em busca de um café ou de um chá que lhes revigorasse a alma ou quando se arrastavam, a custo, para a rua envolta em bruma molhada de chuva. Não se importava com o arrepio que a sacudia e trocava o calor macio das mesas mais protegidas pelas recordações que aquela lhe trazia. Por isso, os olhos perdiam-se-lhe num ponto distante no espaço e se lhe abriam os lábios num sorriso luminoso enquanto comia uma torrada dourada acompanhada por um chá de rooibos.


sábado, junho 02, 2018

Amor de tempos idos

(imagem daqui)


Disse-lhe que estava bonita, que há muito tempo que a não via assim tão alegre e jovial.
Ela sorriu com doçura e esqueceu, por momentos, que ambos passavam dos 90, repenicando-lhe um beijo nos lábios.