(John Sloan - a woman's work)
Lembro-me de, nas tardes longas de Verão da minha aldeia, ver as mulheres de joelhos, debruçadas sobre pedras meio imersas nas águas correntes do rio, esfregando, virando, batendo roupa com vigor. Havia um ritual nessa ida ao rio. Levavam-se as bacias cheias à cabeça e um pedaço de sabão rosa no bolso. As crianças seguiam as mães em revoada, como pardais chilreantes, e havia as conversas que se calavam em casa."O meu Zé atirou-me o prato da sopa à cara, outro dia..." "A Joaquina da Mariana anda com o menino João da casa grande.." "Quem me dera fugir desta miséria." "Mandava era esta roupa toda rio abaixo." "O Quim dorme noutra cama e, quando me quer usar, chama por mim aos gritos. Levo os filhos pela mão mas ele manda-os sair e fecha a porta à chave. Aleija-me sempre, o Quim..." "Tenho oito filhos e nunca vi o meu homem nú."
No fim, havia estendais cheios e as mulheres, de mãos enrugadas pela água, recolhiam os pedaços de sabão rosa que sobrassem, tal como recolhiam as palavras, de regresso a casa.
ResponderEliminar"The Piano"... um dos filmes mais marcantes que já vi.
Tocou-me a ligação que fizeste entre o título do post, o texto... e a música. Precisamente porque ela, Ada McGrath, era muda... e a sua voz era o som do seu piano.
(sou fã confessa de Michael Nyman... e tua fã, mas isso já tu sabes!)
Beijos ao som do piano
(^^)
Também gostei muito do filme e lembrei-me dele pela "falta de voz" das mulheres, precisamente.
Eliminar(obrigada)
Beijinhos Marianos, Afroditezinha! :)
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ResponderEliminar.
. a primeira parte do texto leva.me aos dias da minha infância . o que não deixa de ser muito salutar . a segunda parte do texto prova-me que fui muito distraído quanto ás conversas . :) .
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. beijo meu .
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As conversas são uma mistura das que fui ouvindo ao longo da vida de aldeia. Não quer dizer que fossem todas exactamente à beira do grande tanque do rio.
EliminarBeijinhos Marianos, Intemporal! :)
As vozes continuam vozes
ResponderEliminarAs mulheres continuam mulheres
Os rios perderam o sabão rosa
e o ritual passou a ficar escondido
numa máquina
onde as nódoas se tiram, sem esfregar
As vozes continuam vozes, mas menos ouvidas
E, a propósito, hoje mudei o mundo
mas durou só um segundo
Agora, está na mesma...
Segundo a segundo se muda o mundo!
EliminarBeijinhos Marianos, Rogério! :)
O passado tem encanto
ResponderEliminarmas a sua vida não!
As mulheres eram farrapos
desnudadas por viris mãos!
Onde o homem não se expunha
por vergonha da beleza!
Ainda bem que o tempo muda
e o par sem ter pudor
em simultâneo se desnuda!
Mas há ainda tanto deste passado escondido por aí...
EliminarBeijinhos Marianos, "Maria"! :)
Gosto quando me recordas a infância. A minha avó materna lavava a roupa assim :) e para mim era super divertido :)
ResponderEliminarBeijinho Maria :)
Chapinhar na água, não era? :)
EliminarBeijinhos marianos, VdT! :)
Vidas e tempos que se repetem.
ResponderEliminarHoje ainda não é assim tão diferente.
Sentem-se apenas adaptações aos tempos.
Beijinhos
Infelizmente há muito destas vidas, ainda...
EliminarBeijinhos Marianos, Pérola! :)
"Ajusto-me a mim, não ao mundo."
ResponderEliminarAnaïs Nin
Não é fácil fazê-lo...
EliminarBeijinhos Marianos, Legionário! :)
Um belíssimo quadro, de uma qualquer aldeia.
ResponderEliminarEsboço de vidas lavadas e coradas, num rio de lágrimas!
Onde as cantigas serviam, para afugentar as nódoas de sofrimento!!!
http://diogo-mar.blogspot.com/
Muita amargura escondida, sim, Diogo!
EliminarObrigada pela visita e pelas palavras.