Maria Joana
deparou-se com a notícia, atraída pela fotografia que a acompanhava. Três
freiras, de costas.
"Três freiras foram detidas por
suspeitas de maus-tratos contra menores, residentes num lar juvenil, em Vila
Viçosa."
Já há longos anos que arrumara num canto bem escuro as memórias do internato. O acordar abrupto com as palmas da Irmã Severa, acompanhada de uma oração gritada a plenos pulmões, não para que Deus a ouvisse, mas sim para que nenhuma se deixasse ficar no quente dos lençóis; o duche mais do que apressado; o frio a avermelhar as pernas a descoberto a partir do rebuço dos soquetes brancos; a missa, ainda em jejum; as filas encabeçadas pela freira "ao serviço", para todas as tarefas; as saudades de casa...
Mas, o título! O título... Viu a Flor! A Flor, franzina, morena, grandes
olhos escuros e tristes na carinha magra, de pé, ao fundo do refeitório,
lençóis nos braços, a tremer na camisa de noite fina.
"Olhem bem para a vossa colega (chamavam-lhe asilada e não interna,
por não poder pagar)! É uma porquinha! Fez chichi na cama!"
Hoje não toma pequeno almoço e vai daqui para o tanque lavar o que
sujou!"
Guardava sempre uns biscoitos que a mãe lhe mandava para a Flor, enquanto, em pensamento, fazia uma prece para que todas as freiras fossem para o Inferno!
Deviam experimentar aqui mesmo o julgamento dos homens, já que na sua irracional crença deve ser Deus a ordenar-lhes tais maldades. Belo texto Maria...e doloroso.
ResponderEliminarDeveriam, sim!
EliminarHá memórias que nos rasgam...
Obrigada, CC.
Beijjo