segunda-feira, fevereiro 03, 2014

Partem tão tristes

Senhora, partem tão tristes
meus olhos por vós, meu bem,
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.

Tão tristes, tão saudosos,
tão doentes da partida,
tão cansados, tão chorosos,
da morte mais desejosos
cem mil vezes que da vida.
Partem tão tristes os tristes,
tão fora d' esperar bem,
que nunca tão tristes vistes
outros nenhuns por ninguém.


João Roiz Castel-Branco 

(Foto de Teatro Campo Alegre, Porto)

Não os meus olhos, senhora, mas os vossos,
eles são que partem às terras que não sei,
onde memória de mim nunca passou,
onde é escondido meu nome de segredo.

Se de trevas se fazem as distâncias,
e com elas saudades e ausências,
Olhos cegos me fiquem, e não mais
que esperar do regresso a luz que foi.


José Saramago


 

14 comentários:

  1. Podia juntar o fado e Saramago a passarinhos com saídas antecipadas dos ninhos...
    (acabo de perceber que o comentário deixado não era resignado)

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Nunca é resignado, o meu :)

      Beijinhos Marianos, Rogério! :)

      Eliminar
  2. José Saramago prestou esta homenagem a João Roiz de Castelo Branco, um homem, como ele diz em Viagem a Portugal (1981), «que, pouco mais tendo feito que estes sublimes versos, há-de ser lembrado e repetido enquanto houver língua portuguesa». Uma justa homenagem!

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Uns versos tão belos que não podem mesmo ser ignorados!

      Beijinhos Marianos, Legionário! :)

      Eliminar
  3. Talvez porque o Fado fala maioritariamente de tristeza e saudade o motivo pelo qual nunca gostei muito deste género musical.
    Com o passar dos anos e com a maturidade que eles trazem, já consigo ouvir um pouco... mas este é muito pungente !!

    Vou ali ouvir algo mais ligeiro... e já volto! :)
    ♥♥

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Não sou grande apreciadora de fado mas, neste caso, impunha-se a escolha!

      Beijinhos Marianos, Afroditezinha! :)

      Eliminar
  4. Gosto hoje mais de fado do que aqui há uns anos, mas também não é o meu género musical preferido. Gostei da tua publicação e da maneira como juntaste João Roiz Castel-Branco poeta humanista do século XV, José Saramago e a voz da Amália Rodrigues. Bom Gosto !

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. A m inha posição perante o fado é semelhante à tua.
      Obrigada!

      Beijinhos Marianos, Ricardo! :)

      Eliminar
  5. A intertextualidade como meio de reverência ou de ironia, de concordância ou oposição foi sempre usada na Literatura. Mas confesso que não tinha conhecimento deste versos de Saramago que parece terem uma tendência irónica.

    Um beijo

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Há vários estudos sobre a intertextualidade destes poemas, Saramago declarou admirar a beleza do poema de João Roiz Castel-Branco.

      Beijinhos Marianos, Lídia! :)

      Eliminar
  6. A Cantiga de Amigo de João Roiz é dos mais belos poemas que conheço e apaixonei-me logo por ela quando o li pela primeira vez na adolescência.

    Agradou-me o poema de Saramago, já que é muito mais fácil de ler do que a prosa.

    Beijinhos

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Também é um dos poemas que mais me marcaram. Lindo de morrer!

      Beijinhos Marianos, São! :)

      Eliminar
  7. .

    .

    . ups . tão presente este passado . :) . provavelmente as palavras . estas . nunca chegaram a abandonar os versos . e não é que estão todas lá ? . :) .

    .

    . um beijo meu .

    .

    .

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Eternas, as palavras, no poema.

      Beijinhos Marianos, .intemporal.! :)

      Eliminar