quinta-feira, abril 18, 2024

Siêncio

(Vilhelm Hammershøi)

Houve um tempo de silêncio. Não se sabe como se perderam as palavras, mas fora de repente. A rapariga apaixonada não foi capaz de dizer do seu amor, o homem da mercearia deixou de enunciar as maravilhosas especiarias chegadas de Marrocos, nas escolas não mais se ouviram algarviadas de meninos.

Foram os pássaros que, estranhando a mudez, iniciaram a época dos gorjeios permanentes. Dia e noite, excediam-se em melodias extraordinárias, como que a lembrar da beleza da voz.

Primeiro, apenas as criaturas aladas se fizeram ouvir (diz-se que eram anjos disfarçados de pássaros), mas ao longo dos dias e noites, pouco a pouco, começaram as palavras ditas em surdina pelos amantes, logo as crianças se apressaram a desenrolar pequenas frases em reposta aos incentivos dos pais e, não tardou nada a ser um novo tempo, o tempo das palavras ditas.



(Something Not Right - Glen Alfred)

6 comentários:

  1. Texto belo. Mas... pouco se fala
    do ruidoso silêncio que hoje paira
    É tanta, tanta palavra
    Sem sentido e sem alma

    Valem-nos os pássaros

    Beijo

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  2. "As palavras em pausa são como farpas
    destruindo o sentido do silêncio."
    Só o amor nos salva da falta que as palavras nos fazem. Porque as palavras também contêm a salvação.
    Um exto muito belo.
    Uma boa semana.
    Um beijo.

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  3. Há sempre um pássaro (atrevido)
    a rondar o parapeito, Maria.

    Dentro do silêncio cabem
    todas as palavras mas as
    mais belas sobem das paredes
    ao tecto e soltam-se dos lábios
    em melodias de despertar corações.

    E agora é escusado calar o vermelho
    que desabrocha a flor
    da liberdade e do amor
    Viva, viva Abril, é neste o dia!

    Bj e boa Festa!

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