são as mulheres que
fazem chorar as cebolas
como se descascassem a própria vida
e, arredondando-se então, descobrissem
um corpo, o seu
uma vida, a sua
e, no entanto, nada que de verdade
pudessem seu chamar
ou talvez sim, mas só
aquela gota de água salpicando
um canto do avental onde
desponta uma flor de pano colorida que
ainda ontem ali não ardia
Bénédicte Houart, julho de 2010 © Bénédicte Houart
("Descascando Cebolas" - Lilly Martin Spencer) daqui
Maceradas, as mãos que seguram a faca cortam, primeiro, para puxarem uma casca, depois outra, e outra e mais outra. Despem, aos poucos, a polpa branca e ácida das defesas cor de fogo. Ardem-lhe os olhos, à mulher das mãos maceradas. Supõe-se que seja da acrimónia do fruto quando nu. Ninguém percebe que é ela, avental visível numa flor gritante, ela é que está nua. Ninguém, senão ela, sente o frio do aço.