Naquele dia, a violência derrubou-lhe qualquer defesa e o medo ficou. Apressava-se para chegar a horas, que não era de se atrasar para um compromisso. Passo ritmado nos sapatos pretos, calças da mesma cor, blusa branca e uma écharpe preta e vermelha. Como era habitual, um leve sorriso nos lábios. Pára, frente ao elevador, de costas para o pequeno átrio. Pressente alguém atrás dela e não estranha. Afinal, o prédio tem algum movimento já que alberga diversos escritórios. O elevador chega, vazio, ela abre a porta e tudo se precipita. Um corpo pesado empurra-a de encontro ao fundo com tanta violência que a cara se encosta, espalmada, ao espelho. Tenta ver através dele mas não é capaz. Só um casaco escuro que lhe tapa a cabeça. É demasiado baixa e o atacante é muito alto. Algo pontiagudo magoa-lhe as costelas do lado direito. Tenta mexer-se, escapar daquele corpo que a esmaga mas não tem força para tanto. Lágrimas escorrem-lhe pela cara, enquanto o elevador pára ao atingir não sabe qual andar. "Está quieta, cabra, ou furo-te!" Foram quantos minutos? Cinco? O homem abriu a porta e saiu de rompante. Nem teve forças para se virar de imediato. A blusa esgaçada e as calças manchadas de esperma. Saiu. Estava no último andar de 7. Os escritórios acabavam no 6º. Limpou as lágrimas, pegou na bolsa que tinha caído no chão, desceu dois andares pelas escadas, abriu a porta da sala com a chave que tirou do bolso e fechou-se por dentro. Pegou no telemóvel, ligou para a pessoa que deveria receber dentro de meia hora e disse-lhe que estava doente. Estava doente!
Escolheu não dizer a ninguém. Limpou as calças manchadas como pôde, disfarçou a blusa esgaçada com a bolsa à tiracolo, foi para casa, tomou um duche e deitou a roupa toda ao lixo. Difícil foi voltar lá, ao prédio onde acontecera. Não voltou a usar o elevador.
Uns meses mais tarde, leu no jornal local que um homem tinha sido apanhado a atacar uma mulher num elevador. Tinha antecedentes de violência sobre mulheres. Presente a tribunal, fora solto com termo de identidade e residência. Não teria valido a pena contar, pensou. Apesar de tudo...
Uns meses mais tarde, leu no jornal local que um homem tinha sido apanhado a atacar uma mulher num elevador. Tinha antecedentes de violência sobre mulheres. Presente a tribunal, fora solto com termo de identidade e residência. Não teria valido a pena contar, pensou. Apesar de tudo...
Essas vítimas que permanecem em silêncio sofrem duplamente - a agressão e o silêncio acerca da mesma.
ResponderEliminarBeijinhos
Ficam mais sós na dor.
EliminarBeijos, Pedro. :)
Esse homem existiu mesmo. Eu conheci-o, Maria.
ResponderEliminarEspero que um dia caia na fossa do elevador.
Beijos.
Também reajo assim, Linda. Desejo que caia no fosso!
EliminarBeijos. :)
Conheço uma história parecida, num elevador também!
ResponderEliminarTenho dúvidas que o silêncio será a melhor forma...
beijinhos
Eles repetem os comportamentos...
EliminarBeijos, ars. :)
Querida Maria Eu,
ResponderEliminarApesar de o TIR ser a medida menos gravosa, implica a constituição como arguido e significa a existência de um processo crime. Respeito a opção de calar, mas entendo que a conclusão "não teria valido a pena contar" é precipitada. Quer porque o processo estará no início e culminará com uma sentença que pode vir a condenar o arguido numa panóplia de penas - o TIR não serve como medida quanto à aplicação futura e eventual de qualquer tipo de pena, designadamente não serve para aferir se lhe será ou não aplicada pena privativa da liberdade -, quer porque a omissão da queixa "desculpa" o criminoso, subtraindo aos OPC's e ao julgador o conhecimento da dimensão da conduta penalmente relevante do arguido. É muito diferente olhar para o arguido que roubou uma vez ou para aquele que cometeu uma dúzia de roubos... Apesar de tudo, mesmo que tenha já decorrido o prazo para apresentar queixa, espero que supere o medo e se ofereça como testemunha de acusação, junto do MP.
Bom dia,
Outro Ente.
Talvez ela o faça, não sei dizer.
EliminarBoa noite, caro Ente. Beijinhos.
Compreendo que, neste casos, seja muito difícil para a vítima denunciar o caso, mas o silêncio não é certamente a melhor forma. A denúncia poderá ajudar a evitar muitas outras vítimas.
ResponderEliminarUm beijinho, Maria
Deve ser uma decisão difícil, Miss Smile.
EliminarBeijos. :)
Um beijo ...
ResponderEliminarOutro para ti, amiga, :)
EliminarO silêncio é sempre a pior decisão, ainda que por vezes não aparente.
ResponderEliminarBeijinhos
Pode ser que seja, Maria. Ela saberá.
EliminarBeijos. :)
~~~
ResponderEliminar~ Nunca tinha ouvido falar deste torpe esquema...
~ Há cada tarado...
~ Mais do que uma queixa, talvez agravasse a pena...
~~~ Dias agradáveis. ~~~~~~~~~~~
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Majo, há esquemas inimagináveis!
EliminarBeijinhos e obrigada pela visita. :)
Estes tipos de doença e de violência gratuita deixam-me sempre irritado para com uma sociedade que não consegue controlar este tipo de acontecimentos. No fundo os prevaricadores, acabam por ser libertados ou considerados "doentes" do foro psicológico !...
ResponderEliminarDão-me calafrios...
EliminarBeijinhos, Ricardo. :)
Entendo o silêncio, talvez pela vergonha, pela dor da exposição, pela mágoa e pela tristeza, mas se estes casos forem denunciados e as pessoas tenham conhecimento deles, se possam defender e o violador seja travado... Abraço
ResponderEliminarEla tomou a decisão de calar-se. Não sei se terá coragem para falar, depois deste tempo...
EliminarBeijos, GM.
Só quem vive esta terrível situação poderá avaliar ou compreender a decisão tomada.
ResponderEliminarAcho que devemos respeitá-la.
Um beijinho revoltado
Fê
É difícil pormo-nos no seu lugar, sim, Fê.
EliminarBeijos. :)
É bem difícil avaliar a gravidade e o sofrimento que este tipo de crime provoca. Atrevo-me a dizer que o silêncio será muito mais perturbador pois a "culpa" acompanhará a vítima todos os dias da sua existência.
ResponderEliminarBj
Só ela(s) sabem da dor, Agostinho.
ResponderEliminarBeijinhos. :)