quinta-feira, janeiro 02, 2025

Novo ano para Maria Antónia


 Maria Antónia bem que ouvia o ruído da rua. Automóveis, conversas numa misturada infinita, cães a ladrar…

Remexeu-se, voltou-se a remexer, e, junto com o barulho,  entrou-lhe o passado pela janela!

João Maria, melena à Beatles, sorria-lhe da poltrona da sala verde, na casa de sua mãe. Era Verão! Também havia ruído, mas nada a podia perturbar quando João Maria sorria.

Dezasseis anos! Um mundo inteiro por descobrir! Nada fazia prever que nunca mais veria o rapaz. Soube que partira para França com os pais, pela calada da noite, fugindo de um mandado de captura por perturbação da ordem pública.

Nunca mais regressaram, nem com a revolução de Abril.

Dizia-se que viviam em Paris, num apartamento modesto, situado num cul de sac, junto à Igreja de Saint Sulpice.

Quanto a ela, Maria Antónia, deixou-se de rapazes de melena e acabou por namorar uns quantos de cabelo rebelde e sorriso maroto. Afinal, havia um mundo por descobrir, pensou, aconchegando-se no peito de Afonso.



 (Clair de Lune por Maria João Pires)