Tinham sido tempos difíceis. Bebiana e João chegaram aos quarenta
sem que no céu houvesse uma única estrela ou fossem abençoados com um filho.
Frente ao caldo da ceia, já nem levantavam os olhos da malga, mergulhados num
silêncio pesado embrulhado no cansaço dos dias e na escuridão das noites.
Naquele final de tarde, Bebiana sentiu uma vontade enorme de
comer nêsperas. Raio de coisa, para o que lhe havia de dar, pensou João, saindo
de casa para encostar a escada à nespereira onde despontavam meia dúzia de
frutos mirrados. Bastou a novidade para que se olhassem como há muito tempo não
faziam. Conta-se que foi nessa noite que Luz foi concebida. Estranhamente,
tantos anos volvidos, uma estrela surgiu, solitária, visível por detrás dos
montes que rodeavam a aldeia.
Quando rebentaram as águas a Bebiana e as mãos
hábeis da Sr.ª Tina seguraram Luz em prantos, rasgou-se o negrume, pontilhando-se
de milhares de estrelas.