A sala está fria. Sento-me displicentemente à secretária, verifico a caixa de entrada das contas de email e abro um novo separador. A página do blog aparece ligeiramente desformatada. Mania de mexer no que está quieto. Clico no ícone que me leva à página em branco de uma nova mensagem.
O que vês da tua janela, Maria? Olho para os vidros que ocupam o espaço frontal de lado a lado. Estão a precisar de ser limpos. Tem chovido e já há muito pó no ar. Dou-me conta de que nunca olhei verdadeiramente através desta janela. No entanto, já a abri e fechei inúmeras vezes. Até já a limpei cuidadosamente, com água e detergente, secando-a, de seguida, para logo lhe dar brilho com limpa-vidros e jornais velhos trazidos de casa.
Ouve-se o ruído do trânsito, lá de baixo. Consigo distinguir o trabalhar característico do motor de um autocarro. Pelo horário, deve ser o que parte da paragem em frente para o hospital. Sempre que desço por esta hora vejo a Dona Gracinha, amparada pela filha, a subir o estribo demasiado alto para o seu metro e meio de gente curvado pelas mazelas da coluna. Vão visitar o vizinho, coitado, que está com um malzinho ruim, disseram-me, quando indaguei da sua saúde, estranhando-lhes as deslocações frequentes ao hospital.
Das vidraças empoeiradas, dizia eu, pouco vejo. Um prédio castanho onde pontuam varandas verdes, algumas ostentando plantas trepadeiras denotando pouca rega. Pensando bem, nunca vi ninguém a assomar a nenhuma delas. Talvez nunca tenha, realmente, visto nada desta minha janela, tão ampla e tão pouco usada.