(Paul Klee)
A igreja afigurava-se-lhe bem mais pequena do que nas suas lembranças. Havia um cheiro doce e intenso a flores murchas embora as do altar da Nossa Senhora de Fátima se mostrassem exuberantes de frescura, talvez porque fosse Maio.
Pesava-lhe a memória da sua infância, menina de vestido rodado e laçarotes no cabelo loiro em caracóis, encostada à mãe nas longas missas precedidas de terço. Naquele tempo, as senhoras mais abastadas tinham uma cadeira mais confortável, comprada por elas, e era a menina que se sentava nela, só dando lugar à mãe aquando do acto de ajoelhar.
Espantou-se ao verificar que ainda havia divisão entre homens e mulheres. Tal como no passado, os homens ocupavam os lugares próximos do altar-mor, num nível superior, separado por um degrau, enquanto as mulheres, as crianças e alguns, poucos, homens mais jovens ficavam no nível inferior.
Maria Antónia sentara-se no primeiro banco do nível inferior, como lhe competia, imersa na dor da perda recente. O silêncio da espera pelo padre deixava ouvir a queda de uma ou outra rosa acastanhada pelo apodrecimento e do voo de uma mosca varejeira que entrara pelas portas abertas de par em par.
Estremecia a cada cara reconhecida. A Zefa do Marinho, com quem brincara às casinhas no recanto da despensa; o Sr. Adelino, que lhe pegara tantas vezes ao colo para melhor chegar às cerejas rubras do quintal; a Zita, a quem tinha ouvido falar pela primeira vez de beijos na boca, ...
Não se conteve e chorou. Desabaram todas as lágrimas que tinha sufocado há dias e sentiu que, de certa forma, regressara a casa.
Olha lá, e a Maria Antónia não tem um dia descansado?
ResponderEliminarEm casa a beber chá e a ver Game of Thrones.
A Maria Antónia tem que ir à bruxa!
EliminarBeijinhos,Luís :)
Nada como a missa de domingo
ResponderEliminarpara reconhecer comportamentos
sociais, hábitos e tradições
e reconstituir a memória
todos os regressos despertam emoções
Parece que as memórias nos engolem.
EliminarBeijinhos, Rogério :)
E este seu regresso é mais uma maravilha na escrita.
ResponderEliminarGrata, Pedro!
EliminarBeijinhos
Bem vinda. Gostei da publicação. Linda imagem:))
ResponderEliminarHoje:-Por vezes existem dias sem cor.
Bjos
Votos de uma óptima terça - Feira.
Obrigada, Larissa!
EliminarBeijinhos )
Oremos
ResponderEliminarOremos, irmãos.
EliminarBeijinhos,Puma :)
Maria, Maria, Agostinho sou eu, pelo menos enquanto não chega o mês.
ResponderEliminarTinha vindo aqui e pressentiste-o? é saí mudo nem sei porquoi.
A prosa é uma delícia. Em que igreja se deu o flashback? talqualmente a minha! Na infância havia essa hierarquia de valores na arquitectura da assembleia. E cadeiras e lugares nos bancos com direitos pouco cristãos. Agora não sei que não vou lá.
Beijo.
Perdoa-me o lapso. Já corrigi! :)
EliminarAs igrejas de aldeia deviam ser todas iguais. Espanto-me é que não tenham mudado.
Beijinho e bom final de feriado, Agostinho :)
Gosto muito da narrativa com memórias da infância. Foi um gosto enorme ler-te.
ResponderEliminarUma boa semana.
Um beijo.
Um mundo tão distante e tão próximo, em simultâneo.
EliminarMuito obrigada, Graça!
Beijo
Há muito passado neste Portugal do presente.
ResponderEliminarBeijo, KK :)
Regressar pelo pior dos motivos... mas a casa, é sempre a casa.
ResponderEliminarmuito belo, Tutu
A tristeza ensombra tudo...
EliminarObrigada, Manel! Muito!
Beijocas
Tudo nos vem à memória e tudo muda, menos a Igreja.....
ResponderEliminarBom fim de semana
Uma longa e pesada herança, a da Igreja.
EliminarBeijinhos, São.
Bom Domingo!
Quantas memórias despertam os regressos! Às vezes memórias tristes!
ResponderEliminarBjo e bom fds
Agridoces, as memórias, Lua Azul!
ResponderEliminarBeijo e bom Domingo.
Você me autorizou e eu estou lendo agora.
ResponderEliminarBelo texto... só se regressa à casa, quando se choram as lembranças que ficaram na esteira do tempo!!!
PDR, o facto de ter um blogue erótico não o torna indesejável! :)
EliminarObrigada, os regressos podem ser dolorosos, mas também estão cheios de memórias ternas.
Beijinhos