Havia
anos, Maria Clara tinha entregue o seu coração a Pedro. Era um
coração quase perfeito, não fora a súbita arritmia que o acometia
sempre que na presença dele.
Levara-lho
assim, vermelho vivo e arrítmico, num dia de frio invernoso,
encostando o peito ao dele até que os batimentos se acertassem
naquele peito que não era o seu. Não tardou em descobrir a falta
que lhe fazia, em estando Pedro ausente. Parecia que uma dor muito
funda se aninhava bem ali, no lugar vazio.
Quando,
tempo volvido, lhe bateu um mensageiro à porta com uma encomenda
cuidadosamente embrulhada numa caixa forrada a cetim preto, Maria
Clara percebeu que, rutilando no fundo negro, um coração lívido,
com uma ferida profunda de onde escorria sangue, era o seu.
Dissera-lhe o portador que o homem de quem tomara a caixa lhe pedira
que a informasse que não suportava mais o bater de dois corações
que não tinham o mesmo ritmo.
Levou-o
para o quarto, sentando-se com ele no regaço, hesitando em
retomá-lo, quase como se temesse rejeitá-lo, de tanto que se lhe
estranhara. O implante revelou-se penoso, mas não tardou que um
súbito aconchego lhe consolasse corpo e alma. Afinal, um coração
só pode partilhar-se com alguém que saiba como dois ritmos em
descompasso são predispostos às mais assombrosas melodias.
Quando se entrega o coração a um Pedro a arritmia é quase uma certeza e uma inevitabilidade.
ResponderEliminarBoa semana
O ritmo é fundamental dizem os apreciadores de swing. Será que se referem a um ritmo dual? Beijinhos Maria!
ResponderEliminarque bonito...:)
ResponderEliminarHaja músculo
ResponderEliminare muito cérebro
Bj
Voltamos com gratidão por todos vós, desejando um óptimo 2020. Para poder chegar a todos, hoje, numa breve visita. Bem hajam por não nos terem abandonado.
ResponderEliminarHoje : A fé de voltar...
Bjos
Votos de uma óptima Terça - Feira.
Muito bonito.
ResponderEliminar(tão bonito, isto)
ResponderEliminarUma história muito original e bela. Gostei imenso.
ResponderEliminarUm beijo.
Parece-me tinha deixado uma dádiva de O+. Ou a bolsa se rompeu ou seria imprestável. Mas ao voltar a apreciar a prosa excelente ocorreu-me perguntar quantos corações definham sangrando, suspensos por um fio. Uma coisa é certa não há dois iguais. Para se ajustarem um ao outro é preciso tempo. É preciso amar.
ResponderEliminarBeijo, Maria, e que os cisnes prossigam com as bóias (à cautela).
"Afinal, um coração só pode partilhar-se com alguém que saiba como dois ritmos em descompasso são predispostos às mais assombrosas melodias."
ResponderEliminarOlá Maria, sábias palavras:)
Então esta tese dos corações arrítmicos contraria a outra das canções, que o Tê escreveu e o Rui tão bem cantou :)
ResponderEliminarAinda bem que a Amor faz milagres!
Beijo, Maria tu.
🌹
Que lindo Maria Tu. É difícil isto dos corações descompassados mas possível, sim, quando predispostos.
ResponderEliminarBeijinho
https://www.youtube.com/watch?v=7q5gZFR2dxs
ResponderEliminarFeliz Ano para Ti e para os Teus, Maria !!!
Maria
ResponderEliminarÉ muito bela, a mensagem com fortíssima carga poética: a determinada altura até esquecemos a ilustração, a transcendental obra que deveras nos toca!
É preciso ser sabedoria para criar uma melodia a partir do descompasso, a maior parte não sabe.
ResponderEliminar~CC~