domingo, janeiro 19, 2025

João Maria

 

(imagem daqui)

Sentado num banco do Jardin du Luxembourg, João Maria observa um grupo de homens a jogar quilles de huit, enquanto fuma um cigarro.

Está sol e as árvores verdejantes albergam pássaros irrequietos e gorjeadores. 

Sem mais nem porquê, veio-lhe à lembrança a imagem de Maria Antónia, sentada numa poltrona em frente a si, fazendo-o sorrir, enlevado.

Dezoito anos! Nada fazia prever que teria que se apressar, noite dentro, a reunir alguns parcos pertences e atravessar a fronteira Espanhola, em direcção a França. Uma denúncia anónima alertara a PIDE para a sua participação em reuniões clandestinas e na distribuição de panfletos contra o regime.


Quem sabe, agora que planeia voltar por uns dias, a possa rever?



(Guillaume Poncelet-88)

quinta-feira, janeiro 02, 2025

Novo ano para Maria Antónia


 Maria Antónia bem que ouvia o ruído da rua. Automóveis, conversas numa misturada infinita, cães a ladrar…

Remexeu-se, voltou-se a remexer, e, junto com o barulho,  entrou-lhe o passado pela janela!

João Maria, melena à Beatles, sorria-lhe da poltrona da sala verde, na casa de sua mãe. Era Verão! Também havia ruído, mas nada a podia perturbar quando João Maria sorria.

Dezasseis anos! Um mundo inteiro por descobrir! Nada fazia prever que nunca mais veria o rapaz. Soube que partira para França com os pais, pela calada da noite, fugindo de um mandado de captura por perturbação da ordem pública.

Nunca mais regressaram, nem com a revolução de Abril.

Dizia-se que viviam em Paris, num apartamento modesto, situado num cul de sac, junto à Igreja de Saint Sulpice.

Quanto a ela, Maria Antónia, deixou-se de rapazes de melena e acabou por namorar uns quantos de cabelo rebelde e sorriso maroto. Afinal, havia um mundo por descobrir, pensou, aconchegando-se no peito de Afonso.



 (Clair de Lune por Maria João Pires)